CrônicasVivendo na Itália

Dez impressões dos primeiros 15 dias morando na Itália

1 – Cachorros são muito queridos aqui. Não vi nenhum na rua. São gordos de pelo brilhoso e cheios de si: orgulho cachorro! Saem principalmente nos fins de tarde com seus donos, entram em padarias e cafés refinados, sentam-se em restaurantes e se comportam melhor que meu filho de quatro anos. Alguns donos, porém, não juntam o cocozinho do peludo e algumas praças ficam com cheiro horrível. São praças de cachorro fazer cocô e não de gente passear. 

2 – Cozinhar pode ser prazeroso. Eu que nunca gostei de ter a rotina de cozinhar, tenho achado interessante a comparação dos produtos. A salada com quatro tipos de folhas vem pronta, tudo lavado e fresco. De Foggia saem os tomates mais lindos para toda a Itália. Luigi ama tomates. São pequenos e vermelhinhos. Come uns 10 todo almoço. Ácido úrico, alguém me disse que comer muitos tomates aumenta o ácido úrico.

3 – Sinto falta da rotina de tomar café da manhã ou café da tarde nos cafés. Sim, aqui tem café por todo lado, lindos, requintados, simples, rústicos, básicos e com aquele cheiro de, claro, café. Mas é tão caro! Dei um Google e achei um café simpático. Vamos, amor? Fomos. Chocolates quente, fatia de bolo, dois sanduiches de pão, queijo e presunto. Adivinha quanto? R$ 90. É que sentamos, fomos bem atendidos e aqui se paga mais por isso. A maioria das pessoas come em pé seu docinho e seu cappuccino. Eu agora tenho saído sozinha para caminhar e tomar meu cafezinho, já que Rei e Lui não sentem falta, pois bem, eu preciso do meu momento.

4 – Nunca subestime o frio. Reinaldo adora fazer isso. Quer fingir costume. Eu não, querido! Vim de Roraima! Dezessete graus é frio para um casacão. Ando com o cachecol de macaco e o gorro de tigre do Luigi na bolsa (só comprei esses) e saio atrás dele no primeiro vento gelado. Ninguém ficou resfriado, mesmo saindo de uma Boa Vista de 40°. Já é primavera, mas ainda chega a 10º até as 11h e novamente esfria a partir das 17h.

5 – As moedinhas tem valor. Cappuccino: 1 euro, carne para o almoço: 2,50 euros. Docinho na padaria: 1 euro. Pão quentinho: 1,50. Leite: 0,90 euro. Iogurte: 0,25 euros.

6 – Luigi é comunicativo. Fala com estranhos na rua inesperadamente e muitos não respondem, mesmo quando ele lança um ‘ciao’, que seria um ‘olá’. Nem todo mundo acha criança fofa. Nem todos gostam de ouvir as perguntas sequenciais que ele faz. Os idosos, principalmente, gostam de silêncio e de não serem importunados. Nossa vida tem sido pedir para que Luigi fale baixo, principalmente nos ambientes coletivos.

7 – Sobre eles, os idosos, estão por toda parte. Dirigem carros, vivem nas ruas em grupos, conversando ou de cara amarrada olhando o movimento. São respeitados. Entram nas filas de supermercado na moral, sem nem pedir licença e atravessam as ruas parando o trânsito sem muita cerimônia e sem agradecer aos que pararam.

8 – As mulheres adoram cabelos soltos e desgrenhados. Não! Não são cacheados milimetricamente com aquele movimento fashionista como as brasileiras têm usado. São cabelos armados, nem lisos, nem cacheados, altos, esvoaçantes. E elas parecem exercer certa superioridade diante dos cabelinhos lisos colados na cabeça. Achei poderoso.

9 – Eles sabem que sou brasileira só de olhar. Nem precisam ouvir meu italiano mal falado. Talvez pela minha cor, traços. Não sei. E quando passo, olham pra bunda sim. Não com aquela cara de lascívia dos brasileiros. Olham com toda seriedade, como se fosse obrigatório. É igualmente irritante e os acho igualmente débeis.

10 – Com ingredientes bons, o resultado, a comida, não poderia ser ruim né? Qualquer birosca da esquina serve comidinhas deliciosas. Conhecemos somente dois restaurantes aqui ainda, mas já sei que vale todos os euros cobrados. Nesses dois locais a média para uma família de três é R$150. Com vinho, água e sobremesa, além da comida maravilhosa. Engordei quase dois quilos e já estou voltando à realidade.

Seguimos nossa jornada longe de casa.

Vanessa Brandão

Vanessa Brandão é jornalista amazônida. Manauara de nascimento, criada em Roraima, é indígena descendente do povo Wapichana. Doutoranda em Estudos Literários pela Unesp – SP, mestra em Letras pela Universidade Federal de Roraima (UFRR), pesquisando sobre arte e literatura indígena. Tem especialização em Assessoria de Imprensa e Novas Tecnologias da Comunicação e em Artes Visuais, Cultura e Criação. Publicou seu primeiro livro em 2022, com o título ‘Entre Pinheiros e Caimbés’. Escreve poesias, crônicas e contos e trabalha na produção de um romance. Atualmente mora parte do tempo em Lódz, na Polônia e parte em Boa Vista, Roraima, no Brasil

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